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03/11/2017
Escrito por:Juliana Silveira
Acessibilidade para ganhar o mundo

Hoje a nossa viagem será totalmente sensorial. Vocês topam? 🙂

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E para começar, precisamos que você relembre algum destino incrível que tenha conhecido. Aquela viagem dos sonhos que você fez e adora contar pra todo mundo… Revisite todos os detalhes possíveis: paisagens, sabores, passeios… Relembrou? Ótimo!

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Bom, agora feche bem os olhos. Fechou? Imagine visitar o destino que você acabou de relembrar sem enxergar nadinha ou quase nada. Não tenha medo. Abuse do tato, olfato, audição e paladar. Viva e sinta tudo o que você conseguir. Desfrute da brisa, dos perfumes, dos sons e todas as sensações que o ambiente oferecer. Como esse lugar lhe parece agora? Que lembranças você teria? Diferentes, não é?

acessibilidade para ganhar o mundo

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Pode abrir os olhos. Agora pense: como seriam as suas experiências se você tivesse deficiência visual? Você deixaria de fazer muitas coisas ou só se adaptaria?

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E como será que podemos contribuir para que cada vez mais pessoas com algum tipo de deficiência tenham os mesmos acessos que a gente?

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Para nos ajudar com essas questões e nos inspirar a transformar o mundo num lugar ainda mais bacana, convidamos o carioca e estudante de Direito Lucas Sarmento, um garoto viajado, divertido e guerreiro, para contar um pouco das suas vivências e perrengues devido à deficiência visual. Bora lá!

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“Há muitos raios na roda da vida. Em primeiro lugar, estamos aqui para explorar novas possibilidades” – Ray Charles

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Ser portador de alguma deficiência não deveria privar ninguém de nada, não é mesmo?

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A gente acredita muito num mundo mais inclusivo e feliz sim. Um mundo aonde ir e vir seja apenas uma questão de escolha e não oportunidade. Onde atravessar a rua, pegar um ônibus, ir a um restaurante, uma balada ou viajar seja para TODOS.

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Projetos como o #PraCegoVer, que incentiva o uso de descrição das imagens postadas nos Facebook para ficarem legíveis aos cegos, e a associação Mais Diferenças, que promove e implementa práticas para garantir direitos humanos aos deficientes, são exemplos para que essas distâncias fiquem cada vez menores.

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Muita coisa bacana já está sendo feita, mas sabemos que ainda temos que melhorar. E para deixar você ainda mais otimista e motivado, que tal conhecer o Lucas?

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Lucas Sarmento é um carioca gente boa e uma dessas pessoas que faz diferença por onde passa. Portador de baixa visão desde sempre, ele aprendeu cedo que sem luta, oportunidades, informação, amigos e família, tudo fica mais difícil. E ele tá certo!

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Suas histórias, viagens, perrengues e lições de vida começam agora.  <3

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Vem se inspirar!

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Foto de Lucas no Parque das Ruínas, em Santa Tereza (RJ), com vista para o Pão de Açúcar.

 

Lucas visitando o Palácio De Cristal em Petrópolis (RJ).

Lucas mergulhando em Maragogi (Alagoas). Mar azul cercado por peixes.

 

No Museu do Louvre (Paris) em frente ao quadro da Monalisa.

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O Bom de Viajar: Ler um livro, ir à escola, trabalhar, sofrer preconceitos e ter que enfrentar todo o tipo de obstáculos ou inacessibilidade é uma realidade para quem tem deficiência visual, certo? Atividades corriqueiras podem se tornar os maiores desafios no dia a dia de quem enxerga pouco ou não tem nenhuma visão, né? Então Lucas, conta um pouco da sua história pra gente: como foi crescer com baixa visão? Quais foram seus primeiros grandes desafios a partir da infância? E quando você se deu conta que teria que lutar muito para afrontar tudo isso?

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Lucas Sarmento: Fui diagnosticado com deficiência visual, baixa visão, logo quando eu nasci. Tive uma vida repleta de desafios que tive que vencer até chegar à universidade. Cresci em uma família humilde, em um bairro pobre da Zona Norte do Rio de Janeiro. Minha mãe não tinha condições de pagar mediador nem colégio particular para mim, então, toda minha formação acadêmica foi em escolas públicas. Meu primeiro grande desafio já começou na alfabetização, a carência de materiais adaptados fez com que meu primeiro processo de alfabetização fosse complicado e demorado. Passei toda minha vida escolar ouvindo, pois tanto meus professores quanto meus colegas de classe ditavam o conteúdo do quadro e dos livros para eu poder escrever no caderno. E isso teve um impacto na minha alfabetização, como eu era acostumado a ouvir e não a ler, demorei muito até chegar à norma correta da escrita em algumas palavras, e até hoje eu tenho essa dificuldade. Ao longo da minha vida escolar, me deparei com diversos professores que não tinham ideia de como ensinar alguém com deficiência visual. Na maioria das vezes, tive que me virar pra poder criar métodos para mim mesmo… E foi assim que fui sobrevivendo à escola. O preconceito que eu sofria me fazia ter total desinteresse de ir às aulas e me deixava depressivo. Fui melhorando com ajuda de amigos que levo no coração por toda minha vida e por professores dedicados que se esforçavam muito para me incluir e me ensinar. Quando passei para o Colégio Pedro II, para fazer o ensino médio regular, que eu comecei a tomar gosto pelo saber e me interessei mais por estudar. Foi lá que eu vivi um verdadeiro projeto de inclusão social, algo que o colégio faz muito bem. Fui muito bem recebido pela comunidade escolar.

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Montagem com duas fotos. Primeira em Edinburgh, no Reino Unido, e segunda na Escócia. Vista para a cidade.

Posso dizer que até hoje, nunca me senti tão bem dentro de um espaço como eu me sentia dentro do Colégio Pedro II. E foi lá também que eu percebi que pra ter um projeto político pedagógico de inclusão eu precisava abrir a boca pra falar e lutar pra ser ouvido. Foi aí que entrei para o movimento estudantil e político, fiz parte do grêmio estudantil e fui conselheiro do Conselho Superior do colégio, instância que deliberava as pautas da escola. Em toda minha atuação política eu levantava a pauta da pessoa com deficiência, pois mesmo em um colégio democrático e com uma estrutura boa para receber alunos com deficiência, passei muita dificuldade, principalmente em relação a professores que se negavam a querer participar de um projeto de inclusão. Hoje eu tenho 22 anos, estou cursando direito na UERJ, sou diretor do centro acadêmico e faço parte do movimento RUA. Minha luta não acabou ainda, tenho muitos desafios pela frente e pretendo não parar.

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Bomde: Lucas, você comentou com a gente que, por conta dos problemas que passou durante a vida, passou a ser militante político e social. De que forma você se dedica contra os problemas de acessibilidade no Brasil? E com quais outras causas sociais você está engajado atualmente? Quais os maiores avanços do nosso país em termos de acessibilidade? E quais ainda são as maiores falhas? Como nós, enquanto sociedade, podemos colaborar para uma vida mais inclusiva?

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Lucas: Hoje atuo no movimento estudantil, construindo a gestão do centro acadêmico da faculdade de direito da UERJ e militando no movimento RUA. Sempre levanto a pauta da pessoa com deficiência nos debates, principalmente os relacionados à educação. Hoje não atuo só na questão da pessoa com deficiência, mas também de outras minorias como LGBTS e demais classes oprimidas. O Brasil teve avanços significativos em relação às questões das pessoas com deficiência como, por exemplo, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que entrou em vigor há pouco tempo, e a implementação de cotas no ENEM, que até as edições passadas não tinha. Mas precisamos avançar em políticas públicas para a permanência dessas pessoas com deficiência nos espaços acadêmicos, pois não adianta só entrar na universidade. Precisamos estar incluídos e ter os mesmos direito de aprender que os demais alunos têm. Precisamos focar na saúde mental das pessoas com deficiência, porque vivemos em uma sociedade ansiosa, e para nós, pessoas com deficiência, é muito mais agravante. Outro ponto extremamente importante, e que precisa ser trabalhado, é a visibilidade das pessoas com deficiência. A sociedade precisa conhecer melhor, saber que existem pessoas com deficiência, suas necessidades, quem são elas e o que elas passam. Mais da metade da população desconhece que existem, dentro da deficiência visual, pessoas com baixa visão de diferentes níveis, por exemplo. E isso é algo que precisa ser passado nas escolas, como matérias de diversidade, onde no ensino fundamental as crianças tenham acesso a estudo de sociedade, em que elas saibam e aprendam a viver com diferenças. Isso pode fazer com que acabe o preconceito em nosso país.

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Bomde: Lucas, você estuda Direito na UERJ, viaja, sai com amigos e faz de tudo um pouco. Como faz para ter o máximo de autonomia no dia a dia? A tecnologia é a sua grande aliada? De que maneira?

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Lucas: Hoje posso dizer que tenho uma vida social bastante ativa, gosto bastante de sair e viajar. Mesmo com minhas limitações, eu dou um jeito de me virar e conseguir me locomover no dia a dia. A tecnologia vem me ajudado bastante, o celular acabou tendo outras funções como a lupa e até mesmo aplicativos de GPS, que me ajuda a descer do ônibus em lugares que não conheço. O tablet substitui o caderno e os livros em papel, e isso me ajudou a ter mais acesso a leitura acessível, e me auxilia bastante na vida acadêmica.

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Montagem: Lucas em cima de quadriciclo nas areias da praia de Maragogi (Alagoas). Segunda foto: em meio a ruela de Olinda cercada por casas típicas coloridas. Foto três: stand up paddle sobre as águas claras de Porto de Galinhas, coqueiros ao fundo.

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Bomde: Viajar é uma paixão? Você costuma viajar sozinho, com a família ou com os amigos? Se já viajou sozinho, conta um pouco como foi a sua primeira experiência estrada afora… Como você se virou? As pessoas costumam ser solidárias e atenciosas? Quais destinos você já visitou (no Brasil e exterior)… E qual foi mais incrível? E em termos de acessibilidade, qual desses destinos você destacaria?

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Lucas: Eu AMO viajar, conhecer lugares e culturas diferentes me fascina. Busco sempre viajar com amigos ou família. Não gosto muito de viajar sozinho, me sinto solitário e fica difícil de realizar algumas tarefas que exigem muito da minha visão. Em fevereiro deste ano eu embarquei em direção a Londres para a casa de uma amiga. Embarquei sozinho, tive uma escala de 16 horas em Roma, na Itália, e saí para conhecer a cidade. Foi minha primeira experiência totalmente sozinho. O celular me ajudou muito, tanto em tarefas simples de tirar foto de placas e ampliar na tela do celular para eu poder enxergar, quanto os aplicativos de GPS para pode me locomover. Consegui, sem dificuldades, conhecer a maravilhosa cidade histórica de Roma usando transporte público da região e foi uma experiência incrível. Na Inglaterra tive algumas experiências de sair sozinho para explorar a cidade de Londres, e também posso dizer que foi tudo incrível. Londres é nota 10 no quesito acessibilidade: os ônibus são nivelados à calçada, tem sempre um guarda para poder te ajudar e é tudo muito bem sinalizado. Uma experiência legal de destacar foi quando fui usar o trem em Londres e o funcionário da estação me ajudou e me acompanhou até o trem, quando percebeu que estava com dificuldades em enxergar o painel de saída dos trens. Além de conhecer a Inglaterra e a Itália, eu já fui a Paris, na França, e à Escócia, ambas acompanhado de amigos, e também não tive nenhuma dificuldade. Das viagens nacionais, já fui a Recife, Maceió, Florianópolis, Brasília, São Paulo, Bonito, Minas Gerais e Goiânia. Todas viagens sempre acompanhado de amigos ou da família. Pude perceber que no Brasil a acessibilidade nos museus vem melhorando muito. Guias preparados e áudios com transcrição são cada vez mais comuns, ajudando na inclusão e, com certeza, gerando mais interesse de pessoas com deficiência a frequentar mais esses lugares.

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Lucas encostado em tradicional cabine telefônica vermelha, na cidade de Londres. Big Ben ao fundo.

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Urban Art: pintura realizada na parede de sobrados em Glasgow, Reino Unido. Homem com touca cercado por passarinhos.

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Lucas em frente ao Arco do Triunfo, em Paris, na França.

Bomde: Lucas, qual o maior perrengue que você já enfrentou por causa da deficiência visual?

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Lucas: O maior perrengue que já passei por conta da minha deficiência foi ter que pegar um ônibus sozinho numa estrada super movimentada. Acabei pegando o ônibus errado e indo parar em um lugar super perigoso. Pegar ônibus no Brasil sempre foi nosso maior desafio. rsrs

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Bomde: E qual lugar do mundo está na sua wishlist de viagem?

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Lucas: Com certeza a Grécia, meu sonho é conhecer esse país histórico.

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Bomde: Complete a frase: um mundo melhor é mundo em que…

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Lucas: Um mundo melhor é um mundo em que não existe desigualdade social e nenhum tipo de preconceito, onde as pessoas possam ser livres sem ter que passar por nenhuma discriminação e extrema pobreza.

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Bomde: E para fechar, o que é O Bom de Viajar para você?

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Lucas: É conhecer novos lugares e ter contato com culturas diferentes, toda viagem é um intercâmbio, você sempre enriquece seu conhecimento de mundo, vivendo novas experiências e tendo contato com diferentes culturas, ajuda você a ser uma pessoa melhor.

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O Lucas é o nosso novo muso inspirador e tamu junto! Voa alto para onde você quiser, garoto!

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E para também fazermos diferença e contribuir um pouco com a inclusão digital, a partir de agora vamos colaborar com a hashtag e o projeto #PraCegoVer lá no Facebook do BomdeComo?

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Foto de divulgação do app Be My Eyes. Homem segura smartphone em frente aos seus olhos. Na tela do aparelho, no lugar em que deveriam estar os olhos do homem, aparecem os olhos de outra pessoa.

Explicando: pessoas com deficiência visual utilizam redes sociais como o Facebook com o auxílio de programas de leitores de telas, que transformam em voz o conteúdo escrito dos posts. Porém, para deixar os posts totalmente acessíveis aos cegos é necessário um complemento super simples: basta fazer descrições das imagens postadas, para que através dos programas esse conteúdo fique legível aos cegos.

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Pequenas atitudes podem ajudar muito para um mundo mais igual e inclusivo. <3 Que tal você fazer parte disso também? Hoje, você pode ser os olhos de alguém, por exemplo. 😉 Juntos somos ainda melhores!